Há quem pense que a vida de um jogador de futebol perde sentido após o final da carreira.
Pois bem, tentaremos ilustrar o contrário: que o verdadeiro sucesso vem com o pendurar das botas. Recorrendo aos casos mais rebuscados, claro, deixando de parte os fenómenos conhecidos de comentadores, treinadores e socialites.
Para começar, temos Krpan. Krpan, quem diria, tornou-se num ídolo da criançada. Volumes e volumes de livros, musicais, desenhos-animados e toda uma vasta parafernália de merchandising invadem os espaços comerciais, onde pirralhos aos berros testam a paciência dos pais, reclamando por um contacto mais próximo com Krpan. Tamanho é o êxito que Krpan seguramente não terá saudades dos seus tempos dentro das quatro linhas (ele e toda a gente).
Podemos também recordar Beke – mas é provável que não consigamos, a menos que nos chamemos Carlos Manuel. O vigoroso central que acrescentou centímetros de forma mais notória às defesas de dois clubes arrastados para a lama das divisões inferiores, o Salgueiros e o Campomaiorense, arranjou o seu caminho como actor de cinema. E logo com um papel de destaque num remake de uma saga famosa série dos anos 80, especialmente concebido para si. Os críticos do “Público” já vergastaram com a sua prosa insensível os méritos desta saga, mas as famílias aderiram em massa. E Beke ganhou um novo fôlego.
Até Djukic, o saudoso Djukic que adornou tardes de intensa canícula no S. Luís sob os protestos e gestos bruscos de Paco Fortes, ganhou destaque junto da imprensa internacional. Finalmente, foi-lhe reconhecida a codícia atacante que sempre demonstrou nos relvados. Ou quase sempre. Algumas vezes, pelo menos. Aliás, todos esses loucos anos 90 do Farense, hoje tão distantes e tão irrepetíveis, mereceram uma análise detalhada que agitou todo o mundo desenvolvido, sempre tão atento a eventuais ameaças de armas de destruição maciça. Como é o caso de Djukic.
Bom, mas o contrário também é verdade: lá por estarem no activo, não quer dizer que a vida de um jogador de futebol seja um mar de rosas. Atente-se nestas duas situações.
Kléber, por exemplo, chegou, viu e desapareceu. Não foi um desaparecer violento como o de Adriano, nem um desaparecimento monetário como o de Falcao, nem tão pouco um não-aparecimento como o de Walter. Foi um eclipse temporário a caminhar para o permanente, uma luz já de si trémula que se esvanece com o som dos assobios, um “não” rotundo às finalizações fáceis. Lá para os lados de Contumil afixaram-se cartazes e organizaram-se grupos de buscas. A esperança é a última a morrer. Mas toda a gente sabe que quanto mais tempo passa, mais forte é a possibilidade de Kléber ser esmagado pela roda de um carro durante a noite. A sério.
E também Yannick Djaló passa por momentos delicados. Seja pelo colossal desafio que será inventar um nome para a sua filha, seja pelo facto do silicone da sua mulher ser PIP, ou, quem sabe?, por não ter clube. Não que antes, quando tinha clube, Yannick já não causasse grandes dores de cabeça aos adeptos e a si mesmo, mas, se calhar, ter clube é uma coisa assim para o importante se estamos a falar de um jogador de futebol. O desespero cresce e já vale tudo para colocar Yannick num grémio qualquer. Até anúncios em páginas improváveis dos jornais. Eu escrevi colocar? Peço desculpa, o verbo é mesmo “impingir”. E o Bojinov que não se meta a pau, não, que nem oferecido como brinde do Happy Meal se safa um dia destes.
Pois é, a vida de futebolista dá muitas voltas e raramente é tão linear como o povo julga.
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